
Prefeitura do Rio revoga resolução que reconhecia práticas de matriz africana como complementares ao Sistema Único de Saúde. Seis dias após publicar uma resolução que reconhecia práticas tradicionais de matriz africana como complementares ao SUS no Rio, o prefeito Eduardo Paes (PSD) revogou a medida, na última terça (25).
Segundo a prefeitura, a nova decisão prioriza o estado laico. “A prefeitura do Rio informa que a resolução conjunta das secretarias de Meio Ambiente e Clima (Smac) e Saúde (SMS) foi revogada, em 25/03 no Diário Oficial, com o entendimento de que saúde pública é realizada baseada em ciência. Além disso, a revogação parte do princípio de que o Estado é laico e não deve misturar crenças religiosas em políticas públicas de saúde”.
A mudança de posicionamento repercutiu negativamente entre algumas entidades da sociedade civil ligadas às religiões de matriz africana.
A resolução detalhava o reconhecimento de manifestações da cultura popular dos povos tradicionais de matriz africana e unidades territoriais tradicionais como promotores de saúde e cura complementares e integrativos ao SUS. A publicação listava diversas práticas, como banhos de ervas, defumação, benzedeiras, chás, escalda-pés, ebó e reconhecia automaticamente as unidades territoriais tradicionais cadastradas no Programa Casas Ancestrais como área de abrangência da unidade de saúde. E especificava os segmentos religiosos abrangidos — como Umbanda, Candomblé e Catimbó, entre outros —, enfatizando a responsabilidade de todos na Atenção Primária, ao realizar abordagem diferenciada e respeitosa, considerando as tradições dos indivíduos.
Em suas redes sociais, a Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro) publicou uma nota de repúdio sobre o caso: “A Renafro Saúde reafirma seu compromisso na defesa dos direitos das comunidades tradicionais e seguirá mobilizada para reverter esse ataque ao respeito, à diversidade e à justiça social. Exigimos que a Prefeitura do Rio de Janeiro revogue esse decreto e respeite os avanços nas políticas de saúde para os povos de terreiro”. A organização alega que a medida da prefeitura do Rio ignora diretrizes nacionais importantes e representa uma desconsideração das práticas ancestrais, desrespeito à luta contra o racismo religioso e um retrocesso nas políticas de equidade. “Quando a medicina legal foi instaurada, por volta de 1940, o Estado reprimia os erveiros e seu conhecimento fitoterápico brasileiro, um conhecimento histórico conhecido publicamente pelas religiões de matrizes africanas. O que está em vigor é uma legitimação da supremacia racial e religiosa no Brasil, dada a intolerância religiosa em respeito às religiões matrizes africanas”, disse ao portal G1 Hédio Silva Júnior, coordenador do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro), que pretende notificar a prefeitura cobrando respostas sobre essa mudança de posicionamento.